quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Último índio abatido

Quando o índio viu que das casas de sua vila só havia cinzas e que jamais voltaria a falar com os seus amigos pois já estavam todos mortos e compreendendo a sua solidão, por ter escapado do massacre por estar à caça distante da vila, ele chorou amargamente como nenhum ser humano jamais choraria, e cantou uma antiga canção de seu povo, que lhe fora ensinada pelo seu avô, quando ele ainda era uma criança e os europeus ainda não sujavam aquelas terras sagradas com pólvora e a manchavam de sangue.

E por entre as lágrimas do seu choro, o índio sonhou com uma estrada no futuro para veículos modernos, coisas que só seriam inventadas alguns séculos depois, e que esta estrada cortaria a sua terra, e do seu povo não restaria mais a mínima lembrança, como se aquela civilização tivesse sido apenas uma lenda, como se os seus parentes trucidados não tivessem possuído sonhos, como se aqueles seres humanos que dormiam sobre a areia furados pelo sabre e pelo chumbo não tivessem amado.

Aquela estrada no futuro certamente teria um nome e seria uma homenagem aos exterminadores que vieram do outro lado do oceano.

15/04/1993.