O Brasil é um país que parece que avança para o
passado. Em 16/03/16 a presidenta Dilma Rousseff nomeou Lula da Silva como ministro-chefe da Casa
Civil e um dia depois o juiz Sergio Moro, que comanda o julgamento da operação
Lava-Jato, vazou áudios sobre a nomeação ao telejornal da Rede Globo,
acusando-a de querer obstruir a operação. No outro dia o STF – através de
Gilmar Mendes – decidiu pelo impedimento de posse de Lula. Menos de um ano depois, Temer nomeia Moreira
Franco ministro, apesar de ter sido delatado pela Odebrecht como recebedor de
propinas nas concessões de aeroportos e também em fraudes na CEF. Sob
circunstâncias semelhantes ao caso de Lula, na verdade mais grave pois era
claramente para blindar Franco com foro privilegiado, o STF através de Celso de
Mello o mantém ministro e, obviamente, com foro privilegiado.
E, então, entra em cena o ministro Eliseu
Padilha que diz que o Ministro da Saúde – que comprou terreno no valor de 28
milhões de reais em transação suspeitíssima – foi escolhido em troca de votos
no Congresso Nacional.
Pouco antes do carnaval, o empresário José
Yunes afirma a um jornalista que à pedido de Eliseu Padilha, Lucio Funaro
financiara 140 deputados para garantir a eleição de Eduardo Cunha à presidência
da Câmara dos Deputados. Além disso, Yunes afirmou que Michel Temer e Marcelo
Odebrecht se reuniram em 2014 para acertarem uma propina de 11 milhões de
reais.
Esses fatos estão em evidência agora, durante o
carnaval de 2017. Muitas informações estão aparecendo, procurando dar sentido a
várias informações (que estão sendo divulgadas por Anonymus) como o “Tabapuã
Papers é subura com Temer e Globo” de Eduardo Guimarães no Blog da Cidadania,
publicado em 26/02/2017 e “Xadrez do elo desconhecido entre Temer e Yunes” de
Luis Nassif no Blog GGN, publicado em 27/02/2017. A seguir, reproduzo um texto
do Professor Aldo Fornazieri publicado hoje, também no sítio GGN.
A Lava Jato e
seus inimigos íntimos
Aldo Fornazieri
A grande frente que se formou para perpetrar o
golpe do impeachment está se desfazendo aos poucos. O ponto de convergência
desta frente foi a Operação Lava Jato. Ela era o estandarte, a bandeira
tremulante, na qual estava estampada a cruz para liderar o expurgo dos
corruptos que haviam se apossado do país. Sérgio Moro parecia ser uma espécie
de São Bernardo de Clairvaux, cujos pareceres nos processos e nos mandatos eram
verdadeiras chamadas à mobilização de cruzados. Ou, quem sabe, era o bispo Fulk
um dos chefes da Cruzada Cátara para combater com violência os hereges porque,
entre outras coisas, estes queriam uma maior igualdade.
Nas cruzadas do impeachment todos eram santos: os
que foram às ruas, os integrantes do judiciário, os porta-vozes da grande
mídia, os políticos contrários ao governo Dilma, os deputados do indescritível
espetáculo do 17 de abril, os grupos que pregavam a volta dos militares etc.
São Michel, com seu cortejo de anjos e arcanjos, haveria de purificar o Brasil
com seu jeitinho manso, com sua habilidade de conversar, com sua capacidade de
construir consensos. O Brasil, livre dos demônios vermelhos, seria unificado,
num estalar de dedos a economia voltaria a crescer e o manto verde e amarelo da
ordem e do progresso haveria de produzir paz, contentamento, empregos e
opulência.
Esta grande mentira, que embebedou boa parte da
sociedade, hoje não passa de um espelho estilhaçado em mil pedaços, todos eles
refletindo a face da maior quadrilha de corruptos que se apossou do poder.
Todos eles refletindo as faces de um grupo indigesto de políticos que se
acotovelam para participar da suruba do Foro Privilegiado. Todos eles
refletindo as faces de antigos comparsas que agora querem queimar o sagrado
estandarte no fogo cruzado que objetiva bloquear a marcha da libertação da
terra santa. Até os santos, os chefes dos cavaleiros templários, o São
Bernardo, são diariamente chamuscados pelas chamas que vêm das barricadas que tentam
bloquear a justiça purificadora.
O PMDB, principal beneficiário, se tornou
também o principal inimigo da Lava Jato. Já tentou várias manobras no Congresso
para detê-la. Agora vêm os ataques públicos. Junto com alguns colunistas e
blogueiros de direita, que se valeram de todas as ilegalidades da Lava Jato e
do juiz Moro para derrubar o governo Dilma, desferem petardos contra os
vazamentos seletivos, contra a criminalização da política, contra as conduções
coercitivas, contra a manutenção de acusados na cadeia para que eles façam
delações premiadas, contra o "lado obscuro" da operação e assim por
diante. Investigar corruptos do PMDB e do PSDB virou sinônimo de
"criminalização da política". Contra o PT se tratava de "limpeza
moral". Mas a partir do governo Temer, a fetidez do ar bloqueou até mesmo
a chuva nos céus de Brasília.
O PMDB está na linha de frente no combate à
Lava Jato. Age como se fosse uma infantaria, uma espécie de bucha de canhão.
Já, o PSDB, age como se fosse um grupo de comando de forças especiais. Usa a
inteligência, tem infiltrados poderosos nas trincheiras "inimigas"
como Rodrigo Janot, o próprio Moro, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e o ministro
plagiador. Entre os infiltrados, nem todos são amigos entre si. O único ponto
de convergência consiste em proteger os caciques do tucanato.Uns torpedeiam a
Lava Jato, citando, inclusive, ilegalidades contra petistas; outros,querem
preservá-la no que lhes interessa.
As direitas que patrocinaram as mobilizações de
rua agora estão divididas. De um lado estão aqueles que querem salvar Temer
para salvar o PSDB em 2018. Além de atacarem a Lava Jato, acusam seus
ex-colegas classificando-os de "direita xucra", de fazer o jogo da
esquerda por querem continuar mobilizando contra a corrupção. Ocorre que as
perspectivas de 2018 colocam as direitas em uma encruzilhada, em marchas para
caminhos distintos. A "direita xucra" quer a continuidade das
mobilizações por duas razões: 1) ficar com Temer poderá significar um
naufrágio; 2) não quer uma alternativa tucana, pois está engajada na construção
de um projeto mais à direita - talvez Bolsonaro, talvez um outro candidato a la
Trump.
Temer deveria renunciar e Moro se afastar.
Não é necessário muito esforço de lógica para
perceber o que a "Operação Mula", que envolve José Yunes, Eliseu
Padilha e Michel Temer quer esconder. O PMDB tinha três chefes que recebiam e
distribuíam propinas: Michel Temer, Eduardo Cunha e Eliseu Padilha. Não se
tratava atos fortuitos, ocasionais, mas de operações sistemáticas de corrupção
tramadas, inclusive, em palácios da República.
A continuidade de Temer na presidência da
República foi, é e será uma afronta à dignidade nacional, à moralidade social,
aos conceitos fundantes da Constituição Federal. Se ainda restam alguns
resquícios de comunidade política nacional, Temer precisa se afastar ou ser
afastado. Aqui cabe uma cobrança às sumidas oposições: sem o afastamento de
Temer, o futuro da dignidade da política, da sua moralidade, da
responsabilidade, estará comprometido por anos seguidos. Sem a saída de Temer a
herança que ficará serão os escombros da democracia e a percepção de que golpes
valem a pena.
O juiz Moro, por seu turno, não tem mais
condições morais de permanecer à frente da Lava Jato. Em recente palestra
proferida nos Estados Unidos ele afirmou que não contribuiu para derrubar
Dilma. Ele não só contribuiu de forma decisiva como, agora se sabe, agiu
deliberadamente para proteger os mal-feitos de Temer ao cancelar perguntas
dirigidas pela defesa de Cunha ao presidente-usurpador. Ao barrar as perguntas
de Cunha, o juiz Moro cometeu duas ilegalidades: 1) barrou o direito de defesa,
algo que não cabe a nenhum juiz praticar; 2) prevaricou, pois o certo era
permitir que se pudesse conhecer aquilo que as perguntas pretendiam revelar.
Vejam-se apenas duas das perguntas barradas por
Moro dirigidas a Temer: "Qual a relação de Vossa Excelência com o Sr. José
Yunes?" e "O Sr. José Yunes recebeu alguma contribuição de campanha
para alguma eleição de Vossa Excelência ou do PMDB?". Moro classificou
como "chantagem" e "provocações" as perguntas da defesa de
Cunha. Está claro que ele agiu para proteger Temer, protegendo um esquema
criminoso.
A cada dia que passa, as provas deixam mais
evidente que quem destruiu a Petrobras pela corrupção foi o PMDB. A destruiu
para agora entregar os seus ativos ao capital estrangeiro. Este governo foi
instituído para liquidar as empresas brasileiras a preço de banana, para
entregar os direitos dos trabalhadores ao capitalismo de predação, para vender
as aposentadorias de pobres idosos ao capital financeiro, para destruir a
educação e a saúde públicas.
Agora a mídia e setores de direita querem
vender a seguinte equação: a política vai mal, mas a economia vai bem, pois os
indicadores estariam melhorando. Proclamar a queda da inflação e dos juros como
grande feito desse governo significa vender fumaça, pois os dois indicadores
são consequência do efeito inercial da recessão. Na verdade, a política está
podre e a economia vai mal. Uma economia que tem mais de 12% de desempregados
não pode estar bem. Uma economia que produz novos pobres todos os dias não pode
estar bem. Uma economia que destrói o pouco de seguridade social do seu povo
vai muito mal.