sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Mudanças, Camões

Luís Vaz de Camões, poeta português que viveu no século XVI, é famoso, entre outros, por seus belos sonetos que versam sobre diversos temas. Abaixo, um de seus mais famosos sonetos.

Soneto LVII

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.

Amor: Petrarca e Camões

Francesco Petrarca foi contemporâneo de Dante Alighiere, viveu eternamente apaixonado por Laura de Novaes, ou simplesmente, Laura, para quem o poeta produziu dezenas de sonetos e poemas. Petrarca parece ter sido uma das grandes referência do grande poeta português Luís de Camões. Nesta postagem apresentamos um soneto de cada um dos dois poetas, cujo tema é exatamente o Amor.

           
           O amor, segundo Petrarca:
Se amor não é qual é este sentimento?
Mas se é amor, por Deus, que cousa é a tal?
Se boa por que tem ação mortal?
Se má por que é tão doce o seu tormento?

Se eu ardo por querer por que o lamento?
Se sem querer o lamentar que val?
Ó viva morte, ó deleitoso mal,
Tanto podes sem meu consentimento.

E se eu consinto sem razão pranteio.
A tão contrário vento em frágil barca,
Eu vou para o alto mar e sem governo.

É tão grave de error, de ciência é parca
Que eu mesmo não sei bem o que eu anseio
E tremo em pleno estio e ardo no inverno.

O amor, segundo Camões:
Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Sonetos para a amada

Na postagem anterior o tema "Amor" é explorado por meio de sonetos tanto por Petrarca quanto por Camões, onde se pode inferir sobre a influência do primeiro sobre o segundo. Mas esta influência fica mais explícita quando o tema é a morte de suas amadas. Abaixo, momentos distintos (e ao mesmo tempo similares) de grandes poesias.



                        Soneto para Laura, que se encontrava doente.

                        Francesco Petrarca:


A alma minha gentil que agora parte
Tão cedo deste mundo à outra vida,
Terá certo no céu grata acolhida,
Indo habitar sua mais beata parte.

Ficando entre o terceiro lume e Marte,
Será a vista do sol escurecida,
Virá depois, muita alma ao céu subida,
Vê-la – portento de natural e arte.

E se pousasse entre Mercúrio e Luz,
Brilhara mais do que eles nossa bela,
Como só se espalhara a fama sua.

A Marte certo não chegara ela.
Mas se mais alto o seu vulto flutua,
Vencera Jove e qualquer outra estrela
            Soneto para uma jovem, que pereceu num naufrágio.
            Luís de Camões:
Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento Etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente,
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Algũa cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.




Manhã em Hiroshima

Após a primeira arma de destruição em massa ter sido lançada sobre Hiroshima, em 1945, o poeta japonês Sankichi Toge escreveu o belo poema Manhã, reproduzido abaixo. Ele é um verdadeiro libelo a favor de que os frutos da ciência sejam usados apenas em benefício da humanidade. Aproveitando o tema reproduzimos também o poema Rosa de Hiroshima, escrito por Vinicius de Moraes e musicado por Gerson Conrad. Rosa de Hiroshima fez muito sucesso nos anos de 1973 e 1974 na voz do vocalista do grupo Secos e Molhados, Ney Matogrosso.


Manhã
Sankichi Toge

Eles sonham:
Um trabalhador sonha, baixando a picareta,
o suor transformado em cicatrizes pelo clarão.
Uma esposa sonha, dobrada sobre a máquina de costura,
entre o odor doentio da sua pele aberta.
Uma empregada de bilheteira sonha,
as suas cicatrizes escondidas,
como pinças de caranguejo, nos dois braços.
Um vendedor de fósforos sonha,
com pedaços de vidro partido cravados no pescoço.

Eles sonham:
Que bandeiras festivas tremulem
à sombra das árvores, onde os trabalhadores repousam
e as lendas de Hiroshima
são contadas por lábios suaves.

Eles sonham:
Que esses suínos com forma de homem
que não sabem como utilizar o poder
do centro da Terra senão para a carnificina.
Apenas sobrevivam em livros ilustrados
para as crianças.
Que a energia de dez milhões de cavalos-vapor por grama,
mil vezes mais forte que um poderoso explosivo.
Passe do átomo para as mãos do povo.
Que a colheita rica da ciência seja levada, em paz, ao povo
Como cachos de uvas suculentas
Húmidas de orvalho
Apanhadas
Ao amanhecer.


Rosa de Hiroshima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

Quatro poetas brasileiros

Sob a sombra de velhas árvores discutem otimistas inveterados a respeito da vida. Ao lado, taças de cicuta.


Velhice / Alberto de Oliveira

Água do rio Letes, onde passas?
Venha a mim o teu curso benfazejo
Que sepulta alegrias ou desgraças
No mesmo esquecimento sem desejo.

Quero beber-te por contínuas taças...
E às horas do passado que revejo,
Pedir-te que as afogues e desfaças
Na carícia e na esmola do teu beijo!

Quem de si nunca esteve satisfeito
E com novas empresas só procura
Corrigir seu engano ou seu defeito,

Não pode recordar sem amargura
Que a mais nenhum esforço tem direito
Na ruína presente e na futura...


As Pombas / Raimundo Correia

Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
Das pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sangüinea e fresca a madrugada.

E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais, de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações onde abotoam
Os sonhos, um a um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais.


Remorso / Olavo Bilac

Às vezes uma dor me desespera...
Nestas ânsias e dúvidas em que ando,
Cismo e padeço, neste outono, quando
Calculo o que perdi na primavera.

Versos e amores sufoquei calando,
Sem os gozar numa explosão sincera...
Ah ! Mais cem vidas ! com que ardor quisera
Mais viver, mais penar e amar cantando !

Sinto o que desperdicei na juventude;
Choro neste começo de velhice,
Mártir da hipocrisia ou da virtude.

Os beijos que não tive por tolice,
Por timidez o que sofrer não pude,
E por pudor os versos que não disse!


Velho Tema I / Vicente de Carvalho

Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.

O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.

Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,

Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.

Quatro poetas franceses

Num lugar lúgubre, uma carniça jaz sob uma mesa verde, quatro homens conversam à luz de velas sob o olhar atento de um corvo assombroso... Bate à porta uma vendedora de roupas. Alguém diz: "Entra".



O Albatroz / Charles Baudelaire

Às vezes, por prazer, os homens de equipagem
Pegam um albatroz, enorme ave marinha,
Que segue, companheiro indolente de viagem,
O navio que sobre os abismos caminha.

Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas,
Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado,
Deixa doridamente as grandes e alvas asas
Como remos cair e arrastar-se a seu lado.

Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo!
Ave tão bela, como está cômica e feia!
Um o irrita chegando ao seu bico em cachimbo,
Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia!

O poeta é semelhante ao príncipe da altura
Que busca a tempestade e ri da flecha no ar;
Exilado no chão, em meio à corja impura,
As asas de gigante impedem-no de andar.

Delírios II Alquimia do Verbo / Arthur Rimbaud 

Para mim. A história das minhas loucu-
ras.    Há muito me gabava de possuir todas as
paisagens possíveis, e julgava irrisórias as celebridades
da pintura e da poesia mo-
derna.     Gostava das pinturas idiotas, em por-
tas,  decorações, telas circenses, placas, iluminuras populares;
a literatura fora de moda, o latim da igreja,
livros eróticos sem ortografia,
romances de nossos antepassa-
dos, contos de fadas, pequenos livros in-
fantis, velhas óperas, estribilhos ingênuos,
rítmos ingênuos.      Sonhava  com as cruzadas,
viagens de descobertas de que não existem relatos, re-
públicas sem histórias, guerras de religião esmagadas,
revoluções de costumes, des-
locamentos de raças e continentes: acredi-
tava em todas as magias.      Inventava a cor das vogais!
- negro E branco, I vermelho, O azul, U ver-
de. Regulava a forma e o movimento de cada consoante, e,
com ritmos institivos, me vangloriava de 
ter inventado um verbo poético acessível, um dia ou outro,
a todos os sentidos. Era comigo traduzí-los.
Foi primeiro um experimento. Escre-
via silêncios, noites, anotava o inexprimível.
Fixava vertigens. 
(Tradução de Paulo Hecker Filho)

Aparição / Stéphane Mallarmé

A lua estava triste. Arcanjos sonhadores
Em pranto, o arco nas mãos, no sossego das flores
Aéreas, vinham tirar de evanescentes violas
Alvos ais resvalando entre o azul das corolas.
– Era o dia feliz de teu primeiro beijo.
Para me torturar, meu sonho, meu desejo
Embriagavam-se bem do perfume de queixa
Que mesmo sem remorso e sem motivo deixa,
No coração que o colhe, a colheita de um sonho.
Eu ia à toa, o olhar no chão velho e tristonho,
Quando trazendo nos cabelos um sol lindo,
Na alameda e na tarde apareceste rindo.
E eu julguei ver, com seu chapéu de luz, a fada
Que nos meus sonhos bons de criança mimada
Sempre deixou nevar dentre as mãos mal fechadas
Punhados celestiais de estrelas perfumadas.

O amor no chão / Paul Verlaine

O vento da outra noite derrubou o Amor
Que, no mais misterioso recanto do parque,
Nos sorria, ao esticar malignamente o arco,
E cujo ar nos fez meditar com fervor!

O vento da outra noite derrubou-o! O mármore
com o sopro da manhã, disperso, gira. É triste
Olhar o pedestal, onde o nome do artista
Se lê com muito esforço à sombra de uma árvore,

É triste ver em pé, sozinho, o pedestal!
Melancólicos vêm e vão pensamentos
No meu sonho, onde o mais profundo sofrimento
Evoca um solitário futuro fatal.

É triste! — E mesmo tu, não é? ficas tocada
Plo cenário dolente, embora te divirtas
Com a borboleta rubra e de oiro, que se agita
Sobre a alameda, além, de destroços juncada.


(Tradução de Fernando Pinto do Amaral)

A morte de Nanã

Patativa do Assaré é o nome artístico de Antônio Gonçalves da Silva, grande poeta nordestino. Teve educação formal, em escola, por apenas três meses durante toda a sua longa vida de agricultor. Produziu os seus mais de 1000 poemas (que sabia de cabeça) enquanto trabalhava no seu roçado, no interior do estado do Ceará. Abaixo reproduzimos um dos seus poemas, “A morte de Nanã”, que consiste em 210 versos heptassílabos, distribuídos em 21 estrofes de 10 versos. Poesia em estado bruto.

A morte de Nanã

Eu vou contá uma história
Que eu não sei como comece,
Pruquê meu coração chora,
A dor no meu peito cresce,
Aumenta o meu sofrimento
E fico ouvindo o lamento
De minha alma dolorida,
Pois é bem triste a sentença,
De quem perdeu na existência
O que mais amou na vida.


Já tô véio, acabrunhado,
Mas em riba deste chão,
Fui o mais afortunado
De todos filhos de Adão.
Dentro da minha pobreza,
Eu tinha grande riqueza:
Era uma querida filha,
Porém morreu muito nova.
Foi sacudida na cova
Com seis ano e doze dia.


Morreu na sua inocência
Aquele anjo encantadô,
Que foi na sua existência,
A cura da minha dor
E a vida do meu vivê.
Eu beijava, com prazê,
Todo dia de manhã,
Sua face pura e bela.
Era Ana o nome dela,
Mas eu chamava Nanã.


Nanã tinha mais primô
Do que as mais bonita jóia,
Mais linda do que as fulô
De um tá de Jardim de Tróia
Que fala o doutô Conrado.
Seu cabelo cacheado,
Preto da cor de veludo.
Nanã era meu tesouro,
Meu diamante, meu ouro,
Meu anjo, meu céu, meu tudo.


Pelo terreiro corria,
Sempre se rindo e cantando,
Era nutrida e sadia,
Pois, mesmo se alimentando
Com feijão, milho e farinha,
Era gorda, bem gordinha
Minha querida Nanã,
Tão gorda que reluzia.
O seu corpo parecia
Uma banana maçã.


Todo dia, todo dia,
Quando eu voltava da roça,
Na mais completa alegria,
Dentro da minha paioça
Minha Nanã eu achava.
Por isso, eu não invejava
Riqueza nem posição
Dos grande deste país,
Pois eu era o mais feliz
De todos filho de Adão.


Mas, neste mundo de Cristo,
Pobre não pode gozá.
Eu, quando me lembro disto,
Dá vontade de chorá.
Quando há seca no sertão,
Ao pobre falta feijão,
Farinha, milho e arroz.
Foi isso que aconteceu:
A minha filha morreu,
Na seca de trinta e dois.


Vendo que não tinha inverno,
O meu patrão, um tirano,
Sem temê Deus nem o inferno,
Me deixou no desengano,
Sem nada mais me arranjá.
Teve que se alimentá,
Minha querida Nanã,
No mais penoso maltrato,
Comendo caça do mato
E goma de mucunã.


E com as braba comida,
Aquela pobre inocente
Foi mudando a sua vida,
Foi ficando diferente.
Não se ria nem brincava,
Bem pouco se alimentava
E enquanto a sua gordura
No corpo diminuía,
No meu coração crescia
A minha grande tortura.


Quando ela via o angu,
Todo dia de manhã,
Ou mesmo o rôxo bêjú
Da goma da mucunã,
Sem a comida querer,
Oiava pro de comê,
Depois oiava pra mim
E o meu coração doía,
Quando Nanã me dizia:
Papai, ô comida ruim!


Se passava o dia inteiro
E a coitada não comia,
Não brincava no terreiro
Nem cantava de alegria,
Pois a falta de alimento
Acaba o contentamento,
Tudo destrói e consome.
Não saía da tipóia
A minha adorada jóia,
Enfraquecida de fome.


Daqueles óio tão lindo
Eu via a luz se apagando
E tudo diminuíndo.
Quando eu tava reparando
Os oínho da criança,
Vinha na minha lembrança
Um candieiro vazio
Com uma tochinha acesa
Representando a tristeza
Bem na ponta do pavio.


E, numa noite de agosto,
Noite escura e sem luá,
Eu vi crescer meu desgosto,
Eu vi crescer meu pená.
Naquela noite, a criança
Se achava sem esperança.
E quando veio o rompê
Da linda e risonha aurora,
Faltava bem poucas hora
Pra minha Nanã morrê.


Por ali ninguém chegou,
Ninguém reparou nem viu
Aquela cena de horrô
Que o rico nunca assistiu,
Só eu e minha muié,
Que ainda cheia de fé
Rezava pro Pai Eterno,
Dando suspiro magoado
Com o seu rosto moiado
Das água do amô materno.


E, enquanto nós assistia
A morte da pequenina,
Na manhã daquele dia,
Veio um bando de campina,
De canário e sabiá
E começaram a cantá
Um hino santificado,
Na copa de um cajueiro
Que havia bem no terreiro
Do meu rancho esburacado.


Aqueles pássaro cantava,
Em louvô da despedida,
Vendo que Nanã deixava
As miséria desta vida.
Pois não havia recurso,
Já tava fugindo os pulso.
Naquele estado mesquinho,
Ia apressando o cansaço,
Seguindo pelo compasso
Das música dos passarinho.


Na sua pequena boca
Eu vi os lábio tremendo
E, naquela aflição louca,
Ela também conhecendo
Que a vida tava no fim,
Foi arregalando pra mim
Os tristes oinho seu,
Fez um esforço ai, ai, ai,
E disse: “abença papai!”
Fechou os ói e morreu.


Enquanto finalizava
Seu momento derradeiro,
Lá fora os pássaro cantava,
Na copa do cajueiro.
Em vez de gemido e chôro,
As ave cantava em coro.
Era o bendito perfeito
Da morte de meu anjinho.
Nunca mais os passarinho
Cantaram daquele jeito.


Nanã foi, naquele dia,
A Jesus mostrá seu riso
E aumentá mais a quantia
Dos anjo do Paraíso.
Na minha imaginação,
Caço e não acho expressão
Pra dizê como é que fico.
Pensando naquele adeus
E a culpa não é de Deus,
A culpa é dos home rico.


Morreu no maió maltrato
Meu amô lindo e mimoso.
Meu patrão, aquele ingrato,
Foi o maió criminoso,
Foi o maió assassino.
O meu anjo pequenino
Foi sacudido no fundo
Do mais pobre cemitério
E eu hoje me considero
O mais pobre deste mundo.


Soluçando, pensativo,
Sem consolo e sem assunto,
Eu sinto que inda tô vivo,
Mas meu jeito é de defunto.
Envolvido na tristeza,
No meu rancho de pobreza,
Toda vez que eu vou rezá,
Com meus joêio no chão,
Peço em minhas oração:
Nanã, venha me buscá!