sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Cem anos da partida de Proust

Hoje, 18 de novembro de 2022, faz exatamente cem anos da morte de Marcel Proust. Para lembrar essa data importante da literatura universal, reproduzo abaixo um pequeno trecho de "A prisioneira", quinta parte de sua obra "Em busca do tempo perdido". Esse texto refere-se ao momento da morte do escritor Bergotte, que pode ser vista como a morte de qualquer grande escritor ou de qualquer grande artista. É uma bela reflexão.

"Nova crise prostrou-o, ele rolou do canapé ao chão, acorreram todos os visitantes e guardas. Estava morto. Morto para sempre? Quem o poderá dizer? Certo, as experiências espíritas não fornecem a prova de que a alma subsista, como também não a fornecem os dogmas da religião. O que se diz é que tudo se passa em nossa vida como se nela entrássemos com o fardo de obrigações contraídas numa vida anterior; não existe razão alguma em nossas condições de vida nesta terra para que nos julguemos obrigados a praticar o bem, a ser delicados, mesmo a ser corteses, nem tampouco para que o artista culto se julgue obrigado a recomeçar vinte vezes um trabalho, cuja admiração que suscitará pouco lhe há de importar ao corpo comido pelos vermes, como o pedaço de parede amarelo pintado com tanta ciência e requinte por um artista desconhecido para sempre e apenas identificado pelo nome de Vermeer. Todas essas obrigações que não encontram sanção na vida presente parecem pertencer a um mundo diferente, fundado na bondade, no escrúpulo, no sacrifício, mundo diferente deste e do qual saímos para nascer nesta terra, antes talvez de voltar a viver nele sob o império dessas leis ignotas a que obedecemos porque trazíamos em nós o seu ensinamento, sem saber que aí as traçara – essas leis de que nos aproxima todo labor profundo da inteligência e que são invisíveis, nem sempre, aliás! – para os tolos. De sorte que não há inverossimilhança na ideia de não ter Bergotte morrido para sempre. Enterraram-no, mas durante toda a noite fúnebre, nas vitrinas iluminadas, os seus livros, dispostos três a três, velavam como anjos de asas espalmadas e pareciam, para aquele que já não existia, o símbolo da sua ressurreição."

Certamente, muitas centenas de anos ainda estarão por vir, trazendo justas homenagens a Marcel Proust e à sua obra.

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