domingo, 3 de março de 2019

Cinzas

Milhares de pessoas recitam seus pequenos poemas para si mesmas, às vezes declamam para algum familiar ou amigo, às vezes simplesmente as poesias ficam esquecidas no fundo de uma gaveta, até que as traças as venham devorar sem deixar vestígios. É um pouco como o professor taciturno e misterioso do Memória da Casa dos Mortos, de Dostoiévski, que guardava os seus escritos, todas as lembranças de uma vida trágica e dura no fundo de um baú, onde jaziam seus poucos e miseráveis pertences, lembranças essas que se perderiam na poeira do tempo se não fosse o protagonista da história, que resolveu publicá-las. Tentarei nesse espaço apresentar alguns poemas de amadores, como já havia pensado em fazê-lo há algum tempo. Na presente ocasião reproduzo o poema Cinzas, de Maria Amélia Cavalcante (D. Lily), feito há quase 60 anos.

É sentir como da alma o arrebatar nosso querido ente
Ver consumir-se e em chama arder
Aquilo que era amor a conversar.
E era alma na pena a escrever
Uma mais uma, o fogo a alimentar
As cartas todas e o seu retrato enfim.
Toda a esperança de que foi outrora
A poesia e o doce verbo amar
Em negras cinzas reduzir-se agora.
Somente Deus fará ressuscitar
E dará vida, é certa a essas cinzas
Que em silêncio falam.
Somente Deus fará ressuscitar
Da morte à vida que essa cinzas calam.

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