sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Manhã em Hiroshima

Após a primeira arma de destruição em massa ter sido lançada sobre Hiroshima, em 1945, o poeta japonês Sankichi Toge escreveu o belo poema Manhã, reproduzido abaixo. Ele é um verdadeiro libelo a favor de que os frutos da ciência sejam usados apenas em benefício da humanidade. Aproveitando o tema reproduzimos também o poema Rosa de Hiroshima, escrito por Vinicius de Moraes e musicado por Gerson Conrad. Rosa de Hiroshima fez muito sucesso nos anos de 1973 e 1974 na voz do vocalista do grupo Secos e Molhados, Ney Matogrosso.


Manhã
Sankichi Toge

Eles sonham:
Um trabalhador sonha, baixando a picareta,
o suor transformado em cicatrizes pelo clarão.
Uma esposa sonha, dobrada sobre a máquina de costura,
entre o odor doentio da sua pele aberta.
Uma empregada de bilheteira sonha,
as suas cicatrizes escondidas,
como pinças de caranguejo, nos dois braços.
Um vendedor de fósforos sonha,
com pedaços de vidro partido cravados no pescoço.

Eles sonham:
Que bandeiras festivas tremulem
à sombra das árvores, onde os trabalhadores repousam
e as lendas de Hiroshima
são contadas por lábios suaves.

Eles sonham:
Que esses suínos com forma de homem
que não sabem como utilizar o poder
do centro da Terra senão para a carnificina.
Apenas sobrevivam em livros ilustrados
para as crianças.
Que a energia de dez milhões de cavalos-vapor por grama,
mil vezes mais forte que um poderoso explosivo.
Passe do átomo para as mãos do povo.
Que a colheita rica da ciência seja levada, em paz, ao povo
Como cachos de uvas suculentas
Húmidas de orvalho
Apanhadas
Ao amanhecer.


Rosa de Hiroshima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

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