Proust também explora o perdão,
olhando o caso da Duquesa de Guermantes com o jovem Marcel, que numa
época passada a perseguia diariamente nas ruas de Paris durante o seu
passeio matinal. Pequena passagem do "O caminho de Guermantes" do "Em
busca do tempo perdido", na primorosa tradução de Mário Quintana;
"Para
terminar, direi que, sob certo ponto de vista, havia na Sra. de
Guermantes uma verdadeira grandeza, que consistia em apagar por inteiro
tudo o que outras só teriam esquecido incompletamente. Mesmo que nunca
me houvesse encontrado a espiá-la, a acossá-la, a seguir-lhe a pista em
seus passeios matinais, mesmo que nunca houvesse respondido à minha
saudação cotidiana com uma impaciência irritada, mesmo que nunca
houvesse mandado Saint-Loup passear quando rogara que me convidasse, não
poderia ela ter comigo maneiras mais nobremente e mais naturalmente
amáveis. Não só não se demorava em explicações retrospectivas, em
meias-palavras, em sorrisos ambíguos, em subentendidos, não só mostrava
na sua afabilidade atual, sem retrocessos, sem reticências, algo de tão
altivamente retilíneo como a sua majestosa estatura, mas as queixas que
podia ter tido contra alguém no passado estavam tão inteiramente
reduzidas a cinzas, e essas próprias cinzas eram lançadas tão longe da
sua memória ou pelo menos da sua maneira de ser, que ao ver seu rosto de
cada vez em que tinha ela de tratar com a mais belas das simplificações
o que em tantos outros seria pretexto a resquícios de frieza, a
recriminações, parecia a gente assistir a uma espécie de purificação."
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