Proust,
em outro momento de grande inspiração, consegue apreender uma faceta da
realidade bastante cara à maioria das pessoas. Expressando-se através
do personagem Marcel no primeiro volume de Em busca do tempo perdido,
ele fala do efêmero que sobrevive por vários anos e das recordações
que o tempo faz desaparecer impiedosa e inexoravelmente para sempre.
"As
flores que então brincavam na relva, a água que passava ao sol, toda a
paisagem que cercou seu aparecimento continua a acompanhar a lembrança
delas com sua face inconsciente ou distraída; e por certo, quando eram
longamente contemplados por aquele humilde passante, aquele menino
pensativo - como é contemplado um rei por um memorialista perdido na
multidão -, aquele recanto de natureza, aquele trecho de jardim jamais
poderiam pensar que graças a ele é que seriam chamados a sobreviver em
suas particularidades mais efêmeras; e no entanto aquele perfume de
pilriteiro que vagueia ao longo da sebe onde em breve o substituirão as
roseiras bravas, um rumor de passos sem eco na areia de uma alameda, uma
bolha formada contra uma planta aquática pela água do rio e que logo
rebenta, minha imaginação os carregou e os fez atravessar tantos anos
sucessivos, ao passo que em torno desapareceram os caminhos e estão
mortos aqueles que os pisaram, e a lembrança daqueles que o pisaram."
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